A taxação de compras internacionais de até US$ 50 (cerca de R$ 277), que começa a ser feita, a partir deste sábado, 27, pelas plataformas de comércio eletrônico Aliexpress, Shein e Shopee representa um novo capítulo da queda de braço entre o varejo nacional e internacional. No final de junho, o presidente Luís Inácio Lula da Silva sancionou a lei que determinou a taxação de 20% de imposto de importação sobre as compras internacionais de até US$ 50 a partir do dia 1º de agosto. A taxa foi inserida no projeto de lei do Mover pelos deputados.
Para Roberto Wajnsztok, sócio-diretor da Gouvêa Consulting, a nova taxa beneficia o varejo nacional, mas não sobrepõe a competitividade dos produtos asiáticos. “Nossa tributação interna é muito alta, então a mercadoria brasileira se torna muito cara. Às vezes o produto já nasce com um imposto tão alto que já torna ele não competitivo. Enquanto isso, a maioria dos marketplaces asiáticos recebe subsídios fiscais nos países de origem que viabilizam custos muito baixos. Por isso é que mesmo sendo taxados, eles ainda são bastante competitivos.”
Procurada pela reportagem da Mercado&Consumo, o Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV) explica o novo cálculo: “Um produto que vem do exterior ao custo de R$ 100 passa a ter, inicialmente, um acréscimo de 20% de imposto de importação e passa a custar US$ 60 dólares para o consumidor final. Após essa majoração, ocorre a incidência de 17% do ICMS sobre os US$ 60, passando ao valor final de US$ 70,20 (ou R$ 381,89, considerando a cotação do dólar americano em 21 de junho de 2024).”
Hoje, considerando a isenção do imposto de 20%, a mesma compra seria de R$ 318,24, o que representa uma diferença de R$ 63,65. O novo imposto não vai incidir sobre remédios que forem importados por pessoas físicas, segundo o governo federal.
“Para quem tinha zero, o imposto de importação de 20% é um primeiro passo. Ajuda, mas não resolve. Se importarmos o mesmo produto do exemplo pela importação regular, regida pela Receita Federal, a carga tributária será em torno de 80% a 90%. O produto custará então R$ 190. Veja que ainda estamos na metade do caminho”, afirma Jorge Gonçalves Filho, presidente do IDV.
A Shein publicou uma pesquisa feita pela Ipsos para rebater as críticas feitas pelo varejo e indústria nacionais de que a isenção fiscal prevista no Remessa Conforme para compras internacionais de até US$ 50 beneficia quem ganha mais.
Segundo o estudo, no primeiro trimestre de 2024, o percentual de consumidores das classes C, D e E que adquirem produtos internacionais na plataforma da empresa é de 88%, sendo 50% das classes D e E e 38% da classe C. Na plataforma chinesa, é possível comprar roupas femininas a partir de R$ 3,89.
“O aumento vai gerar um impacto para o consumidor e vai provocar desistências de compras, afinal não vai ser mais aquele preço ultracompetitivo. Eu penso que ele vai olhar de forma crítica: se antes ele comprava uma blusa por R$ 20, agora ele vai pagar R$ 24, R$ 28. Às vezes, comparando com o mercado nacional, ele vai ver que outras blusas custam R$ 40, R$ 50, então ainda vai estar valendo a pena. Uma alíquota de 20% não é motivo para um recuo agudo”, Wajnsztok opina.
Apesar da sanção presidencial, Lula sinalizou ser contra o imposto. Em entrevista concedida à Rádio CBN no dia 18 de junho, o presidente disse achar equivocada a taxação. “Por que taxar US$ 50? Por que taxar o pobre e não taxar o cara que vai ao free shop e gasta US$ 1 mil? É uma questão de consideração com o povo mais humilde.”
Na época, Lula destacou que a sanção seria feita pela “unidade do Congresso e do governo, das pessoas que queriam”. “Mas eu, pessoalmente, acho equivocado a gente taxar as pessoas humildes que gastam US$ 50”, comentou.
O que é o Projeto Mover?
A cobrança de taxa para produtos que custam até US$ 50 comprados em sites internacionais foi incluída dentro do Projeto de Lei 914/24, que institui o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), destinado ao desenvolvimento de tecnologias para produção de veículos que emitam menos gases de efeito estufa.
O imposto é uma demanda do setor varejista nacional, que vê competição desleal com a isenção às empresas estrangeiras, uma vez que hoje são cobrados apenas 17% de ICMS sobre o e-commerce internacional.
Em agosto do ano passado, no âmbito do programa Remessa Conforme, o governo federal isentou do Imposto de Importação as compras internacionais de pessoas físicas abaixo de US$ 50, no caso de empresas que aderirem ao programa, uma espécie de plano de conformidade que regularizou as transações.
Após negociações, a aprovação do Imposto de Importação se deu em acordo entre o Congresso e o governo federal. A alíquota de 20% sobre o e-commerce estrangeiro foi um “meio-termo” e substituiu a ideia inicial de aplicar uma cobrança de 60% sobre mercadorias que vêm do exterior e custam até US$ 50. O porcentual será de 60% para produtos mais caros, mas foi incluído também um desconto de US$ 20 nas compras acima de US$ 50 e de até US$ 3 mil.
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