Em conversa com a coluna, CEOs da Renner e da Riachuelo rebatem Shein e defendem isonomia tributária com importados
Por globo
Mariana Barbosa
21/05/2024 04h01 Atualizado há uma semana
Fabio Faccio, CEO da Renner, e Andre Farber, CEO da Riachuelo: concorrentes unidos pelo fim da isenção para importados — Foto: Divulgação
O Congresso deve votar entre hoje e amanhã o fim da isenção para compras internacionais de até US$ 50 — medida que coloca em lados opostos a indústria e o varejo nacionais e as plataformas de e-commerce asiáticas como Shein, Shopee .
— Quem votar contra o projeto é contra o país — diz o CEO da Renner, Fabio Faccio, que saiu de um estado de emergência em Porto Alegre, sede da empresa, envolvido com as ações de apoio à população afetada pelas enchentes, para acompanhar em Brasília as discussões sobre o projeto que vê como urgente para a sobrevivência da indústria nacional.
— A gente nunca viu na história geopolítica mundial um país que fizesse protecionismo às avessas como estamos vendo no Brasil. Que cobra 90% da sua própria indústria e isenta de impostos as estrangeiras, que já são isentas de impostos em seus países de origem. Não aprovar esse projeto é aprovar a desindustrialização do país — completa, lembrando que, no ano passado, só o setor têxtil perdeu 30 mil postos de trabalho.
A isenção do imposto de importação até US$ 50 (R$ 250) foi a forma encontrada pela Receita Federal para regularizar as importações via e-commerce, que eram feitas simulando uma venda entre pessoas físicas para não pagar imposto. A isenção do programa Remessa Conforme, contudo, era para ser temporária. A cobrança estava originalmente prevista para outubro, com uma alíquota menor, entre 30% e 40%, mas até hoje não foi adotada.
Sem definição por parte do governo, o fim da isenção foi incluído no início do mês pelo relator Atila Lira (PP-PI) no projeto de lei que cria o programa Mover, de incentivos fiscais para a indústria automotiva. A medida, contudo, enfrenta resistência do PT — que teme que o “imposto das blusinhas” afete a popularidade do presidente Lula.
— É tão evidente que precisamos de regras iguais para o produto nacional e estrangeiro que os sindicatos de trabalhadores estão se mobilizando junto com a gente e falando em nome da indústria nacional. Isso é raro — diz o CEO da Riachuelo, André Farber, que concedeu entrevista junto com o concorrente.
A Shein também está com seu time em Brasília, mobilizada para tentar barrar o fim das isenções. O argumento da plataforma de moda chinesa é de que a cobrança prejudica o acesso da população mais pobre a produtos mais acessíveis. Em conversa com a coluna na semana passada, a diretora de assuntos governamentais da Shein, Ana Beatriz Lima, chegou a comparar a isenção de US$ 1,5 mil para quem viaja de avião (incluindo free shop) à isenção de US$ 50 no e-commerce. — Para as classes A e B, que viajam para o exterior, há a isenção. Já a classe C não pode comprar uma blusinha isenta? — questionou.
Faccio rebate o argumento: — Essa é uma narrativa falsa. Um estudo da Nielsen mostrou que 60% dos consumidores da Shein são de classe A e B. A isenção de US$ 1,5 mil poderia sim ser menor. Mas estamos falando de R$ 2 bilhões em gastos com duty free contra R$ 50 bilhões. É outra ordem de grandeza. Sem contar que não existe isenção para produtos da cesta básica, por que deveria ter para “blusinha importada”?
Desde que aderiu ao Remessa Conforme, a Shein vem absorvendo o custo da alíquota de 17% do ICMS, sem repassar para o preço final. No entanto, a empresa tem sinalizado que não tem como absorver mais uma alíquota de 60% e que a medida elevaria a carga total da importação para 92%.
— Incrível eles falarem isso, que podem sair do país se a alíquota for a 90%. Bem-vindo ao nosso mundo. A nossa carga tributária já é de 90%. E nós estamos gerando emprego. Essa é a grande demonstração de que o regime de isenção é de uma profunda desigualdade tributária e que a retórica deles não para em pé. A gente não quer benefício, apenas isonomia. Se é para ter produto mais acessível para os mais pobres, reduz o meu imposto que o produto que eu vendo por R$ 30 eu baixo para R$ 15 amanhã — diz Farber.
Outro argumento usado pelos defensores da isenção até US$ 50 é de que essa é uma prática comum em cerca de 90 países. — Essa é uma meia verdade. Muitos países têm carga menor que a nossa e o problema é menos grave. Os EUA estão revendo. Nenhum país dos BRICs dá isenção. A Indonésia baixou a isenção para até US$ 3 e no dia seguinte as plataformas foram embora.
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